sexta-feira, 20 de novembro de 2015

O piano duplo de Brasília


Uma vez flanando pelo centro de Brasília, ao crepúsculo desses dias de horário de verão, aproveite que o avançado do dia já alterou o ciclo circadiano e apareça no Museu Nacional da República, aquele prédio em forma de cúpula, assinado por Oscar Niemeyer, na Esplanada dos Ministérios.

Maranesi (d) e Gomyde (e): dois pianos em um
No civilizado horário de 19h30 (entrada franca e livre para todas as idades), começa o recital das pianistas Ana Amélia Gomyde e Elenice Maranesi, que vão utilizar o piano duplo de Brasília construído pelo luthier Rogério Resende. Como a foto ilustra, são dois pianos em um, portanto, chamar de recital a quatro mãos pode não ser apropriado. Apesar de usarem as quatro mãos, o termo parece ser usado quando dois pianistas sentam lado a lado e usam o mesmo teclado.

Perfumaria à parte, trata-se de oportunidade rara de ver o ouvir dois talentos do piano de Brasília, trabalhando em um instrumento difícil de ver por aí. No Brasil, talvez seja o único.


Gustave Lyon (1837-1936)
O piano em questão é uma réplica de um doublepiano Pleyel francês, projetado por Gustave Lyon, cerca de 1890 e chamado de "Duo-Clave". Conhecedor profundo dos pianos, Rogério Resende praticamente construiu o piano duplo de Brasília a partir de uma gravura.


Rogério Resende (e) e Tomás Patriota (d) curtem essa joia de piano

Medindo 3,23 metros e com o peso de 900 kg, essa "caixona" de música, de fato, é um modelo de caixa com dois quadros metálicos e dois encordoamentos distintos. As duas mecânicas funcionam independentes. Temos aqui o ganho de tons harmônicos, que são vibrados por "simpatia" aos serem executados por dois ou quatro pianistas ao mesmo tempo. Outra vantagem: a tampa abre só para um lado, assim o som se projeta em uma única direção. Com dois pianos juntos, as tampas ficam cruzadas, um problema desde sempre, resolvido parcialmente com a retirada dessas peças.

A Pleyel et Cie. fechou as portas em 2013. Fundada pelo compositor parisiense Ignace Pleyel, em 1807, era a favorita de Chopin, Grieg, Debussy, Saint-Saëns, Ravel, De Falla e Stravinsky. Os "Duo-Clave" foram produzidos em quantidade limitada. Pesando quase uma tonelada e de tamanho exagerado, esses monstrengos, capazes de sons celestiais, não cabiam mais nos espaços diminutos das residências e salas de concerto.


Em tempo, o recital no piano duplo de Brasília acontece no contexto da exposição "Lição de Anatomia - Luteria de Piano", sobre o trabalho do luthier Rogério Resende, em exibição no Museu Nacional da República, em Brasília, até o dia 29 de novembro.

2 comentários:

  1. Hektor, beleza de matéria!

    Gostaria (se possível) que você falasse um pouco daquela "caixa" na qual Mozart retirava suas grandes pérolas, e que da qual saíra a ideia de piano, que veio de gravicembalo col piano e forte, depois pianoforte, cuja abreviação é... Piano.

    grande abraço!
    (Regis-o-belo)

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  2. Caro, Mozart é tão intenso e complicado que os espíritas falam da Casa de Mozart, em Júpiter. Isso, o planeta Júpiter. De outro mundo. Aqui na Terra, só posso dizer que sua música é sublime. Obrigado.

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