terça-feira, 30 de junho de 2015

Aldous Huxley, a música e Brasília IV (segundo Elizabeth Bishop e Antonio Callado)

Antes, um aviso: o jornalista autor deste blog pede perdão aos fotógrafos que registraram as imagens aqui mostradas e que estão sem créditos. Elas foram coletadas na internet e a maioria não revela a autoria das fotos. Da mesma forma, pede perdão pelo uso de informações coletadas na web. Recomenda-se que os leitores procurem os originais. No caso de livros, que adquiram as publicações.
No princípio era o ermo
Antes da inauguração de Brasília, em 21 de abril de 1960, várias personalidades da época visitaram as obras da nova capital do Brasil. Uns vieram logo no início, em 1956 (era o ermo, como disse Vinicius de Moraes, na Sinfonia da Alvorada), mas em 57, 58, ainda com a terra revirada e vermelha mostrando as veias abertas do Cerrado, e uns poucos prédios em pé, viram com os próprios olhos brotar a cidade, entre outros:

  • Elizabeth Bishop (poetisa e escritora norte-americana);
  • John dos Passos (escritor norte-americano);
  • André Maulraux (escritor e então ministro da Cultura da França);
  • Frank “It’s a Wonderful Life” Capra (cineasta norte-americano, que teria filmado um momento da construção, e cujas imagens permanecem inéditas);
  • John Foster Dulles (secretário de Estado norte-americano);
  • Fidel Castro (só teria parado de tagarelar quando fez um sobrevoo ao lado do presidente Juscelino Kubitschek);
  • Golda Meir (então ministra do Exterior, de Israel);
  • David Niven (ator britânico, que também deu um rolê de helicóptero sobre a cidade, ao lado de JK);
  • William Burden (presidente do Museu de Arte Moderna de Nova Iorque);
  • Nobosuke Kishi (Primeiro ministro do Japão);
  • Harold Champion (jornalista inglês, do Daily Telegraph);
  • Giovani Gronchi (presidente da Itália);
  • o príncipe Bernhard (Holanda);
  • o príncipe Mikasa (Japão);
  • Robert Wagner (prefeito de Nova Iorque);
  • Dwight Eisenhower (presidente dos Estados Unidos).
Beauvoir, Niemeyer, Sartre e Jorge Amado, em Brasília, 1961
Jean-Paul Sartre e Simone de Beauvoir vieram logo depois da inauguração. Che Guevara, em 1961, quando foi condecorado por Jânio Quadros.

Che Guevara, em frente ao Palácio do Planalto, 1961
Tirando André Maulraux, que disse a JK: “Esta é a capital da esperança”; e Dwight Eisenhower, que por motivos óbvios (estava selando o compromisso de JK de que o Brasil não viraria e nem daria apoio à Cuba de Fidel e em troca facilitou as coisas do FMI com o país) sentenciou: “Por várias razões, Brasília exerce um fascínio sobre os cidadãos dos Estados Unidos. Brasília é uma epopeia digna das vastas possibilidades e aspirações desta nação"; de resto, pouco se sabe das impressões dos visitantes que chegaram antes da festa (de inauguração).
Einsenhower e JK desfilam em carro aberto, no Rio de Janeiro, 1960

O cosmonauta soviético Yuri Gagarin (o primeiro homem a orbitar a Terra, no espaço sideral), em 1961, mandou essa: “Tenho a impressão de que estou desembarcando em um planeta diferente, não na Terra”.

No caso de Aldous Huxley (1894-1963), objeto desta investigação, em 1958, ficou aquela interrogação sobre o que teria pensado o grande escritor britânico sobre o Brasil e Brasília, enfim, cidade em obras que ele viu, acompanhado da mulher, a violinista e cineasta italiana Laura Archera Huxley.
Aldous e Laura Huxley
Aldous e Laura Huxley passaram três semanas no Brasil, em agosto de 1958, depois de ter visitado Caracas (Venezuela). Sua passagem pelo Rio de Janeiro, São Paulo e Belo Horizonte foi bem documentada pelos jornais que circulavam à época. No Rio de Janeiro, coube ao Correio da Manhã os maiores espaços.

Com um profissional do porte de Antonio Callado (1917-1997) respondendo como editor-chefe, o matutino carioca colocou Huxley em primeira página, pelo menos duas vezes: quando proferiu palestra no auditório do Itamarati (estamos em 1958, o Ministério das Relações Exteriores funciona no centro do Rio de Janeiro) e quando visitou os índios iaualapitis (yawalapitis), à beira do rio Tuatuari (Mato Grosso), onde funcionava o então Posto Capitão Vasconcelos, do Serviço de Proteção aos Índios (a antiga Funai).

Eis o que teria dito Aldous Huxley sobre Brasília: "Vim diretamente de Ouro Preto a Brasília. Que jornada dramática através do tempo e da história! Uma jornada do ontem para o amanhã, do acabado ao que está para começar, de conquistas antigas às novas promessas!".
Elizabeth Bishop
Essas palavras foram amplamente repercutidas na imprensa brasileira, em 1958. Segundo conta Elizabeth Bishop, no artigo “Uma nova capital, Aldous Huxley e alguns índios” (em “Prosa” [Companhia das Letras, 2014], tradução de Paulo Henriques Brito), a declaração teria sido escrita “manu própria” por Huxley a bordo do DC-3 da Força Aérea Brasileira, quando o escritor, a esposa e comitiva (incluindo Bishop) voaram de Brasília até o Posto Capitão Vasconcelos, no Xingu.

Bishop conta que dentro do avião, num momento em que os passageiros interagiam, um homem, “velho e magro, com grandes orelhas e olhos tristes” (depois sabemos que vinha a ser o mesmo que deveria ter encontrado a poetisa norte-americana quando esta chegou sozinha a Brasília, precedendo a chegada do casal Huxley) foi até o assento de Aldous e o entregou uma prancheta com papéis.
Aldous Huxley
Queria o homem que o autor de “Admirável Mundo Novo” escrevesse suas impressões sobre Brasília, sob o argumento de que coletava esse tipo de coisa, para futuramente coloca-las num museu da cidade: “Huxley pegou sua caneta, lançou-se ao trabalho e, depois de rasgar duas ou três folhas de papel, produziu algumas frases sobre a interessante experiência de voar do passado (as vilas coloniais de Minas Gerais) para o futuro, a nova cidade de Brasília. Dois dias depois isso apareceu nos jornais do Rio como se fosse um telegrama enviado por Huxley ao presidente Kubitschek, dando uma estranha impressão do que seria o estilo telegráfico de Huxley”.

Antônio Callado
Ainda dentro do avião, de acordo com Bishop, Antonio Callado teria distribuído aos visitantes pílulas anti-malária e lançou um alerta de que os silvícolas que o grupo iria encontrar não eram exatamente os índios que viviam entocados na mata, mas sim aqueles que já haviam feito contatos com o “branco” e até usavam roupas e calças compridas.

Uma vez em solo, os índios cercaram o grupo, mostrando aquele tipo de interesse fácil de imaginar. Huxley, segundo Bishop, foi apresentado como “um grande capitão e consentiu em ser apalpado com admiração”. Na sequência, Elizabeth Bishop conta o surpreendente e emocionado encontro do sertanista Claudio Villas-Boas com o escritor britânico. Uma vez apresentado a Laura e Aldous, Claudio com os olhos cheios de lágrimas teria dito: “O Huxley, do ‘Contraponto’”? Sim, o livro “Counterpoint”, de 1928, que os brasileiros conheceram na tradução de Érico Veríssimo.

Alto, magro e pálido, de terno e gravata, Aldous Huxley deitou numa rede e foi examinado com interesse. Laura Huxley fez sucesso com uma sensacional câmera Polaroid (aquela que produz a foto em papel, logo depois de tirada). E para completar, o cacique caiapó Raoni Metuktire (aquele do botoque, ornamento de madeira enfiado no lábio inferior, descrito como “Ronny” por Elizabeth Bishop) apareceu, “falador e agradável”, segundo a escritora, “encantador e louco”, segundo Antonio Callado.

Huxley teria ficado encantado com um panapaná (bando de borboletas) à beira do rio. No mais, encantamento total de todo o grupo com os índios, seus hábitos e sua cultura (houve banho de rio e até luta huka-huka, com os índios pintados, em honra dos visitantes). Mais uma vez, os Huxley, Bishop e comitiva voaram para Brasília, para mais um pernoite no Brasília Palace Hotel. No dia seguinte, cada um tomou seu rumo.
Foto que saiu na capa do Correio da Manhã, mostrando Laura Huxley e sua Polaroid com os índios do Xingu
Sob o título “Um Sábio Entre Bugres – Huxley visita os índios do Xingu”, o jornal Correio da Manhã, em sua edição 20.062, de 21 de agosto de 1958, estampou em primeira página a reportagem escrita por Antonio Callado. No texto, uma declarada desconfiança sobre a aventura brasileira de erguer uma capital nos cafundós do Planalto Central (em parte porque sabiam que a gastança um dia viria a cobrar sua dívida).

Eis o lead (primeiro parágrafo):

“Mais do que em nenhum outro país do mundo, no Brasil de hoje um avião pode assumir ares de verdadeira Máquina do Tempo, de H.G. Wells. Pode-se ir, num salto, das duvidosas doçuras de um passado ouro-pretano de gelosias de urupema, Marílias e mantilhas, às duvidosas bênçãos de uma civilização brasílica, que poderá tomar tons do Admirável Mundo Novo de Aldous Huxley”.

À grande pergunta no ar (Huxley gostou ou não gostou de Brasília?), Antonio Callado escreveu:

“Não me perguntem o que achou Huxley de Brasília pois ele é homem de palavras poucas e medidas e deve ter prontamente sentido a atmosfera emocional que envolve a Capital do presidente Kubitschek. Que ele gostou do Palácio da Alvorada gostou. Quando encontrou brevemente Oscar Niemeyer na véspera da partida, cumprimentou-o dizendo: ‘Vous avez fait là quelque chose d’extraordinaire, mon vieux’”.

O repórter, que mais tarde viria a escrever o romance “Quarup” (1967), abre um parêntese e enfia a seguinte opinião: “A mim – entre parênteses – me pareceu que, em relação a Brasília, este jornal, afora uma certa má vontade congênita com a cidade, tem em relação a ela a atitude correta: Brasília merece todos os elogios na seção de artes plásticas, mas muita severidade na última e na sexta páginas. É uma Cidade de Consumidores, plantada num deserto onde não se vê um pé de couve. Durante muito tempo vai sugar, com o mata-borrão daquele seu pó vermelho, as energias do país.... Mas uma cidade não começa pelas ferrovias e pelas hortas? Brasília vive em grande parte de uma ponte aérea, como Berlim ao tempo do assédio russo...”.

Considerando que o texto de Callado foi publicado antes do de Bishop, fica a impressão de que a poetisa norte-americana o teve como norte para lançar suas impressões. Callado aproveitou ainda para cutucar os paulistas: “Na volta, conversando com Huxley no avião, veio-me à lembrança um azedo artigo que ‘O Estado de São Paulo’ escreveu com o título acima (‘Huxley e a macumba’). Era um protesto ao fato de, no Rio, haverem levado Huxley a uma macumba. A mim pessoalmente me parece que cada um chega a Deus como pode, e que um terreiro de candomblé, com seu peji enfeitado e seu S. Jorge, vale tanto como uma igreja católica ou uma sinagoga. Quanto a Huxley, quando lhe falei na macumba, e no artigo que causara, ele declarou: ‘- Pois olhe, o rito dos pretos no Rio me fez compreender muito melhor os gregos primitivos’. Grego primitivo! Não é coisa de quatrocentos anos atrás, mas sim de quatro mil”.

Callado conta o episódio do corrimão, no Brasília Palace Hotel, e ainda lembra uma frase marcante da visita de Aldous Huxley à “capital da esperança”: “... cumprimentado por uma jovem e por um engenheiro entusiastas de Brasília, disse Huxley com a maior naturalidade: ‘Quero voltar dentro de dez anos para ver Brasília como uma cidade’.

Huxley queria voltar a Brasília 10 anos depois de ter visto a cidade barro vermelho
Em 22 de novembro de 1963, o assassinato de John F. Kennedy, em Dallas, fez com que qualquer outro obituário ficasse menor. Nesse dia, partiram Aldous Huxley e o irlandês C.S. Lewis, autor de “As Crônicas de Nárnia”.

domingo, 28 de junho de 2015

Aldous Huxley, a música e Brasília III (segundo Elizabeth Bishop)

Laura e Aldous Huxley
Cinco anos antes de pegar o bote mágico, em 1958, Aldous Huxley veio ao Brasil, acompanhado da esposa, a violinista, escritora e cineasta italiana Laura Archera Huxley. O Rio de Janeiro, Brasília (ainda em construção) e uma aldeia no Xingu foram os principais pontos de parada do casal.

Essa viagem foi bem documentada, tanto em meio jornalístico quanto em prosa literária. No primeiro caso, coube a Antônio Callado (1917-1997), jornalista e escritor, que acompanhou o grupo nessa viagem, fazer o relato em reportagens publicadas em agosto de 1958 no extinto jornal Correio da Manhã, do qual foi editor-chefe.



A passagem dos Huxley pelo Brasil foi ricamente descrita pela escritora e poetisa norte-americana Elizabeth Bishop (1911-1979), que por mais de vinte anos morou no Brasil. O filme “Flores Raras”, de 2013, dirigido por Bruno Barreto, baseado no livro “Flores Raras e Banalíssimas” (1995), de Carmen Oliveira, mostra a relação da autora norte-americana com a arquiteta brasileira Maria Carlota “Lota” de Macedo Soares.

O relato de Bishop sobre os Huxley deveria ter sido publicado, à época, pela afamada revista norte-americana The New Yorker, mas o texto acabou recusado e somente em 2006 viu a luz do dia, quando foi publicado na The Yale Review, publicação da Yale University (New Haven, Connecticut). The Yale Review é considerado o mais antigo periódico literário norte-americano e por suas páginas passaram nomes como Thomas Mann, Virginia Woolf, Leon Trotsky, Robert Frost, H.G. Wells, entre outros.

“A new capital, Aldous Huxley, and some indians”, o artigo em seu título original, vem somar ao rico inventário de informações sobre o Brasil coletados por Elizabeth Bishop, ao longo de sua estada em nossas terras. Sua obra de maior fôlego sobre o nosso país, “Brazil”, de 1962, foi de certo modo renegado pela autora, que não concordou com as intervenções de seus editores, da revista Time-Life, para que ficasse mais palatável ao público alvo, os norte-americanos.

Elizabeth Bishop: brasilianista de primeira

Com a distância do tempo e olhando para o farto material produzido, não seria exagero apontar Elizabeth Bishop como uma das maiores brasilianistas que este país já viu.

Voltando a Huxley, o artigo de Elizabeth Bishop que menciona a passagem do grande escritor e pensador britânico por Brasília, antes de sua inauguração, em 1960, merece ser lido, por seu estilo claro e conciso e pela riqueza de detalhes, pois flagra não só os primórdios da nova capital e sua aridez de barro vermelho, como também o eufórico momento, que apresentava ao mundo uma democrática nação, exótica e atraente (talvez o contrário do que o Brasil realmente fosse). Eram os anos dourados, a época pós-Getúlio, da bossa-nova, da tenista Maria Esther Bueno, de Pelé e Garrincha e o campeonato mundial de futebol na Suécia.

Aproveitando a passagem dos Huxley pelo Rio de Janeiro e do natural interesse dos estrangeiros pela construção de Brasília, a Divisão de Cultura, do Ministério das Relações Exteriores planejou a viagem, esticando o itinerário até a nova capital e ao rio Xingu, onde a comitiva ficou de conhecer os índios iaualapitis, no Mato Grosso.

No fundo, a intenção do então presidente Juscelino Kubitschek (1902-1976), ao conduzir estrangeiros até Brasília, era colher deles depoimentos e relatos que endossassem a aventura da modernidade que propunha para o país, até então uma imensa lavoura arcaica.
Brasília, barro vermelho
Segundo conta em “A new capital, Aldous Huxley, and some indians” (“Uma nova capital, Aldous Huxley e alguns índios”, publicado em ‘Prosa’ [Companhia das Letras, 2014], tradução de Paulo Henriques Brito), Elizabeth Bishop chegou sozinha a Brasília, um canteiro de obras, no final do período de inverno (agosto de 1958), a fim de juntar-se à comitiva de Huxley, que chegaria depois. Estavam “prontos” o aeroporto, o Brasília Palace Hotel e o Palácio da Alvorada. O resto, barro vermelho disperso, obnubilando o pensamento.

“A primeira coisa que se apresentou aos meus olhos, assim que saí do avião foi uma banca de engraxates com três cadeiras, junto à parede do pequeno prédio do aeroporto. Naquele momento eu não precisava engraxar meus sapatos, algo necessário para todos os passageiros, na hora da partida. É verdade que estávamos nos últimos dias da época seca, mas no final do inverno de 1958 a primeira e última impressão de Brasília consistia em milhas e milhas e milhas de poeira vermelha”.

Congresso Nacional em obras: melancolia e desolação
O cenário, meio parecido com Marte em obras, ganhou de Bishop a seguinte impressão, muito pouco agradável, é bem verdade: “Brasília está localizada em um planalto vazio, estéril e pouco ondulado, 1.200 metros acima do nível do mar. Já me haviam descrito o lugar, mas eu não estava preparada para tanta melancolia e desolação: comparado com quase qualquer outra parte habitável deste país fantasticamente belo, parece sem atrativos e desanimador. Não existem montanhas nem ao menos morros de verdade, nem rios, ao menos visíveis (existe um pequeno rio a algumas milhas, e dois córregos), nenhuma árvore de nenhum tamanho, nenhuma sensação de altura, nem de grandeza, nem de segurança, nem de fertilidade, nem ao menos de paisagem pitoresca; nenhuma das qualidades consideradas capazes de dar charme ou caráter a uma cidade”.

Já naquela época, entretanto, certas coisas já chamavam a atenção, tanto é que dava para ser clarividente: “As duas dádivas que a Mãe Natureza parece ter reservado para Brasília são céu e espaço, e quando alguém imagina esses planaltos sem fim cobertos por edifícios governamentais brancos e modernos, monumentos, arranha-céus, lojas e prédios de apartamentos, como deverão ficar, a única beleza natural restante é o céu”.
Brasília Palace Hotel: estranho e canhestro
Segue uma descrição pormenorizada do Brasília Palace Hotel (“hotel estranho e canhestro”), suas instalações, decoração e a luta inglória de funcionários para retirar a fina poeira vermelha que tudo tingia. Bishop conta ter presenciado um raro momento de aborrecimento na estada do hóspede Aldous Huxley, quando o escritor quase cai de uma rampa, ao descer uma escada na contraluz, rumo ao restaurante. “Ele mostrou nítidos sinais de irritação, ao seu estilo, e comentou que o corrimão vem sendo usado há milhares de anos e que parecia ‘triste abandonar uma invenção tão útil’”.

Tá vendo Niemeyer? As escadas em espirais, lindas e modernas, sem corrimão são um perigo para quem não enxerga bem. Huxley era cego de um dos olhos; para examinar as coisas de perto usava uma lupa com armação de tartaruga e, para longe, um “telescópio em miniatura”.

Aldous Huxley, 1958
Eis o Huxley que testemunhou a proto-história de Brasília, antes do Paranoá virar lago, nas palavras de Elizabeth Bishop: “Huxley é alto, pálido e magro, é claro, mas sem dúvida parece ser ainda mais alto, pálido e magro no Brasil, onde a maioria dos homens, ao menos para os padrões anglo-saxônicos, é baixa e morena... É difícil dizer quanto ele está vendo e, uma vez que costuma falar muito pouco, o que está pensando... Existe um leve desvio no seu olho defeituoso, e essa característica, que eu sempre achei estranha e atraente, no caso de Huxley vem se somar ao seu olhar velado e sonhador”.

Sobraram, ainda, comentários sobre o Palácio da Alvorada, ali perto. Com JK presente na cidade, a comitiva rumou para a residência oficial, onde primeiro foi barrada pelos irritados sentinelas armados de fuzis, que parecem não ter sido avisados sobre os visitantes, e depois pôde circular e examinar as instalações.

Palácio da Alvorada

“Do lado de fora é sem dúvida um dos mais belos edifícios projetados por Oscar Niemeyer. As colunas, em particular, são um triunfo arquitetônico: trata-se, afinal, da invenção de uma nova ordem”. Essas famosas colunas de mármore branco, de fato, foram bastante admiradas, pelo efeito que conferem ao prédio: “Essas colunas fascinaram a todos nós; foram acariciadas, fotografadas e discutidas por algum tempo, e Huxley e outros até desceram das longas varandas para vê-las de baixo”.
Ermida Dom Bosco, ainda sem o lago Paranoá
Naqueles dias, sem o espelho d’água do lago Paranoá, e sem a invasão de casas da classe média ao longo da paisagem, era possível avistar em destaque a capelinha triangular da Ermida Dom Bosco. Laura Huxley, familiarizada com a vida do santo italiano, fundador da Ordem dos Salesianos, queria caminhar até o local, algo impensável em nossos dias, porém a tarde vinha caindo e ela parece ter sido dissuadida a mudar de ideia.
Cidade Livre: como no Far-West americano
Com Marte em construção, o jeito foi espairecer um pouco na vida pulsante da Cidade Livre (atual Núcleo Bandeirante). A comitiva rumou para um drinque no Hotel Santos Dumont. O cenário, segundo Bishop, bem parecido com as cidades de tábuas do “far West” norte-americano.

Recepcionados pela bela condessa Tarnowska, uma polonesa que parecia se divertir com a bagunça da construção de Brasília, o grupo se sentiu como que transportado para um café do Greenwich Village nova-iorquino. Bishop disse ter visto discos de Stravinsky, Villa-Lobos e Bartók sobre a vitrola. Huxley recusou álcool e bebeu suco de laranja, “misteriosamente disponível”.

Vinda de Anápolis, onde explorava um cinema, a condessa tinha aberto outro da Cidade Livre. Ao grupo, ela contou história pitoresca sobre a exibição de “E Deus Criou a Mulher” (“Et Dieu... créa la femme), filme francês de 1956, de Roger Vadim, que apresentou ao mundo a estonteante Brigitte Bardot.
Brigitte Bardot só para os homens
Recorda Bishop: “O público, homens em grande maioria, assistiu em silêncio, pensando sabe-se lá em quê, até que chegou a cena de nudez. Assim que Brigitte Bardot abriu um botão, o filme de repente parou e as luzes se acenderam. O homem da projeção, que já vira a cena, é claro, disse: ‘Por favor, todas as senhoras e senhoritas queiram sair e esperar do lado de fora’. E elas saíram, sem demora, e ficaram do lado de fora, na rua poeirenta, uma pequena multidão. As luzes foram apagadas e os homens assistiram à cena de amor que se seguiu. Mais uma vez interrompeu-se o filme, as luzes foram acesas, e as mulheres foram convidadas a entrar para ver o resto do espetáculo ‘para público misto’”.
Antônio Callado, experiente
Foi na Cidade Livre que o grupo comprou provisões (cigarros, fósforos, e Salva Vidas, aquela espiral inseticida). Antonio Callado, experiente, arrumou anzóis e linhas de pesca. O dia seguinte estava reservado à visita aos iaualapitis, no Mato Grosso.

sexta-feira, 26 de junho de 2015

Aldous Huxley, a música e Brasília II

Huxley: crítico da dominação do homem pelo homem
Membro da intelectualidade britânica, sobretudo a que floresceu na primeira metade do século passado, Aldous Huxley (1894-1963) esbarrou o cotovelo em gente como T.S Eliott, Bertrand Russell, Virginia Woolf, John Maynard Keynes e D.H. Lawrence, seus contemporâneos, digamos, mais conhecidos.
Admirável Mundo Novo: antiutopia
Apreciadores de sua obra consideram que o ápice de sua trajetória como ensaísta, novelista e crítico cultural da humanidade encontra-se desenvolvida no romance “Admirável Mundo Novo” (“Brave New World”), publicado em 1932, um ano após o volume de ensaios “Music at Night”. Em “Admirável...”, temos uma das mais ricas análises (com um quê de pessimismo) da sociedade humana totalmente dominada pela produção e consumo de massa. Algo talvez não muito diferente do que presenciamos em nossos dias.

A exploração do homem pelo homem, bordão marxista e verdade universal, foi tema caro a Aldous Huxley. Uma das vozes de destaque no coro dos descontentes, e crítico do capitalismo, certa vez ele lembrou a máxima que enquanto um homem descansa, outro carrega pedra. Na verdade, segundo o autor, a irracionalidade nos informa que o lazer de poucos se dá às custas da escravização de muitos.
Huxley: guru moderno
Transformado em autor famoso, sábio, erudito, guru ocidental e personalidade mundial, Aldous Huxley virou um disputado palestrante mundo afora, sobretudo no período que se seguiu ao fim da II Guerra Mundial. Em meados dos anos 1950, chama novamente a atenção com a publicação de “As Portas da Percepção” (“The Doors of Perception”) e “Céu e Inferno” (“Heaven and Hell”), relatos de suas experiências com o consumo de LSD, mescalina e outras drogas.
LSD para partir serenamente
Huxley defendeu o uso consciente dessas substâncias, capazes, segundo afirma, de proporcionar o bem ao homem, uma vez que seriam catalisadoras de processos de desenvolvimento mental. Há controvérsias a respeito, é claro, e deve ter chamado mais a atenção o fato de, em seu leito de morte, em 1963, em Los Angeles, devido a um câncer de laringe, Aldous Huxley ter pedido a sua segunda esposa, a italiana Laura Archera Huxley, que lhe administrasse uma dose de 100 miligramas de LSD. De fato, foram duas doses desse alucinógeno psicodélico injetadas de maneira intramuscular.

Pelos relatos de Laura, não houve agitação e Huxley parece ter partido serenamente. O que se passava em sua mente é um mistério. O momento, óbvio, não poderia ser mais dramático e, para piorar, naquele 22 de novembro de 1963, médicos que o assistiam em seu derradeiro momento, viam perplexos na tv os informes sobre o assassinato do presidente norte-americano John F. Kennedy, no mesmo dia, em Dallas.
Morte no mesmo dia do assassinato de John F. Kennedy

Aldous Huxley, a música e Brasília I

“Da pura sensação à intuição da beleza, do prazer e da dor ao amor e ao êxtase místico e à morte – todas as coisas que são fundamentais, todas as coisas que, para o espírito humano, têm o mais profundo significado, podem apenas ser experimentadas, e não exprimidas. O resto é sempre, em qualquer lugar, silêncio”.
Aldous Huxley, em 1957
Esse texto é o parágrafo inicial do ensaio “O Resto É Silêncio”, escrito pelo autor britânico Aldous Huxley (1894-1963), e parte integrante do livro “Música na Noite – e outros ensaios”, publicado originalmente em 1931.

Neste ensaio, “O Resto É Silêncio”, Huxley abre, em palavras, uma das mais abrangentes possibilidades que a música representa para o espírito humano ao preconizar: “Depois do silêncio, aquilo que mais se aproxima de exprimir o inexprimível é a música” (“After silence that which comes nearest to expressing the inexpressible is music”).

Huxley desce ainda ao cerne do ato humano de ouvir, a experiência do ouvinte, que se vê elevado a outro patamar ao ficar exposto à mais maravilhosa música, ao lembrar que: “Nós ficamos grato ao artista, em especial ao músico, por ‘dizer com clareza o que sentimos, mas nunca fomos capazes de expressar’”.

De fato, como descrever a arte dos sons e seu poder de expressão, quer sejam nas peças instrumentais, quer sejam nas canções, que carregam em si forte carga comunicativa, uma vez que passam uma “mensagem” ao ouvinte e, portanto, direcionam o pensamento para o seu conteúdo? A evocação subjetiva da música se presta às mais variadas vontades humanas, dependendo da circunstância em que é utilizada.
ACDC: música para o bem, música para o mal
Assim, temos um rock pesado, tipo AC/DC, embalando a torrente de adrenalina e aceleração do ritmo cardíaco, em combinação capaz de alegrar e levar euforia à uma multidão em um estádio; da mesma forma que temos o mesmo som sendo utilizado como “arma psicológica”, em incursões de guerra, como a utilizada pelos norte-americanos diante de inimigos muçulmanos, seja ao ar livre no teatro de operações no Iraque ou no Afeganistão, ou em lugares fechados e obscuros como a prisão de Guantánamo. Nesses lugares, o alegre rock pesado foi utilizado em altos decibéis, para “perturbar” (na verdade, torturar) a alma do inimigo.
Guantánamo: música como tortura
A música depende da circunstância e da atividade humana a ela relacionada. Ela tanto pode ser ouvida com atenção ou com a atenção dispersa, tal qual a música de fundo no supermercado ou na sala de espera. O conceito de música ambiental cunhado pelo britânico Brian Eno passa exatamente nesse ponto da curva. Mas deixemos um pouco de lado a atitude passiva do ato de ouvir música, para nos concentrarmos em seu inverso, a vontade de ouvir música e de se expor deliberadamente diante dela.


No ensaio “Música na Noite”, Huxley relata a experiência de aleatoriamente tocar um disco, numa noite mediterrânea de junho sem luar. Aparentemente estava escuro e não dava para ver a escolha, na pilha de discos. O silêncio da noite é interrompido pelo “Benedictus”, da “Missa Solemnis”, de Beethoven. “É o equivalente da noite num outro modo de existência, como uma essência é o equivalente das flores, das quais ela é destilada”, compara o autor, ao tentar exprimir o inexprimível.
Huxley não fala qual gravação da Missa Solemnis foi tocada na escuridão

sábado, 20 de junho de 2015

Juninas x Ecad

Turminha legal mal sabe quanto custa tocar uma música nas festas juninas
Se você mora na região central do Brasil, mais precisamente no quadrado do Distrito Federal, deve achar perfeitamente normal a quantidade de festas populares tipo juninas que acontecem nessa época (meados de junho) nas igrejas, clubes e associações recreativas.
No Congresso Nacional, um lugar não muito confiável, triste, porém verdadeiro, os parlamentares costumam justificar ausência de suas obrigações diante dos tradicionais festejos que acontecem nos estados. Festejos, aliás, que tem por base a tradição católica de comemorar as datas alusivas aos santos.
Pobres moços, ah se soubessem o que sabemos...
Até aí, morreu o Neves. O Brasil é o maior país católico do planeta, e os feriados nacionais, tirando as datas alusivas à pátria, estão repletos de dias “santificados”, conforme supremacia católica apostólica romana que dura milênios.

Na região de Brasília, dada a enorme concorrência, as paróquias e clubes sociais começam esses festejos em maio e até setembro ainda se fala em quadrilhas (a dança) e comidas da estação. Erroneamente, por ignorância e/ou discriminação (o que dá no mesmo), atribui-se à quantidade de nordestinos residentes na área o alto interesse por esse tipo de festejo.

Não temos dados para corroborar tal afirmação, mas fato é que, as festas juninas não são exclusividade do Nordeste e contaminam (ou empolgam) a maioria dos brasileiros, principalmente aqueles que seguem as datas comemorativas como marcos do curso “natural” do ano. É época de Carnaval, então comemora-se o Carnaval. É Semana Santa, então não se come carne, mas chocolate em forma de ovo.... Por aí vai, a pessoa é comandada.
Gonzagão: sinônimo de boa música e arrecadação
No que nos tange, falemos de música. Essa é a época do ano em que é perfeitamente normal se ouvir por aí os versos “Olha por céu, meu amor / Vê como ele está lindo”. É Gonzagão (1912-1989), o Rei do Baião, um dos patrimônios dessa nação, sempre presente e sinônimo de animação musical nas festas juninas. Mas tire o seu sorriso do caminho, pois aqui a coisa começa a ganhar um outro contorno.

Os versos descritos acima, de “Olha Pro Céu” (Luiz Gonzaga / José Fernandes de Carvalho), datam de 1951 e trata-se da quarta obra mais executada no período referente às festas juninas (dados de 2014), segundo informação divulgada pela assessoria de imprensa do polêmico Escritório Central de Arrecadação e Distribuição (Ecad). Falemos depois das canções mais tocadas nessa época, segundo o Ecad.
O Ecad se auto intitula instituição que atua na defesa dos direitos autorais de autores, intérpretes, músicos, editores e produtores fonográficos, e afirma ser responsável pela arrecadação e distribuição dos devidos valores dessa execução pública.

Uma pausa. Não vamos aqui nos ater aos meandros obscuros atribuídos ao Ecad, se de fato faz o que faz e se faz chegar mesmo ao bolso dos autores aquilo que arrecada. Sabemos através do noticiário que o Ecad não é exatamente o que afirma ser. Metam Ecad no motor de busca e vocês verão coisas incríveis sobre esse órgão arrecadador.

Alvo de várias CPIs (Comissão Parlamentar de Inquérito) por causa de acusações de apropriação indébita, fraude, cartel, o escambau, o Ecad segue firme afirmando fazer o que faz.
Criado em 1973, numa época em que a mão de ferro governava este país, o Ecad teria surgido no contexto do controle estatal da execução de obras públicas. Isso, o Estado tinha o controle de, digamos, proteger obras de criação intelectual. Para tanto, valeu-se do diploma legal, a Lei 5988/73, que previa que as diversas associações de autores poderiam se reunir em único órgão, sob a supervisão do extinto CNDA – Conselho Nacional de Direito Autoral. Este CNDA tinha a legitimidade para cobrar, em todo o país, os direitos autorais dos membros dessas associações, no caso de execução pública de suas obras.

Nessa onda surgiu o Ecad - Escritório Central de Arrecadação e Distribuição de Direitos Autorais, empresa privada que, amparando-se na tal Lei 5988/73, poderia atuar na tal cobrança, sob a fiscalização do CNDA. Perceberam o lance? O CNDA, organismo estatal, em pleno regime militar, devia ser formado apenas por burocratas, que não poderiam (não tinham como, não estavam a fim, não tinham o menor interesse) sair por aí fazendo as tais cobranças. Terceirizaram esse serviço para o Ecad.

O resto é história. O Ecad passou por transformações, afastou várias associações que originalmente lhe deram corpo, viu chegar a nova Constituição (1988), nem foi no enterro do CNDA (que, entre outras coisas, tinha a obrigação de elaborar a tabela de cobrança), e lentamente se consolidou como expressão máxima de “arrecadação e distribuição de direito autoral” neste país.

Uma pessoa jurídica de direito privado com poderes de entrar na festa junina da paróquia, no clube, no baile de debutantes, no show, enfim, em qualquer lugar público onde estejam tocando música. Com que objetivo? Arrecadar e distribuir direito autoral. Isso mesmo. Os fiscais entram, pedem a autorização, não tem, sacam o boleto de cobrança e crau! Amigos, isso é tão complicado, porque estamos falando de constrangimento ilegal e também porque o entendimento do que seja público inclui batizados, casamentos, quartos de hotel e motel.
Ah, se o Ecad pudesse: puxaria o fone de ouvido dos zumbis que estão nos ônibus, nos metrôs e nas ruas e tacaria a cobrança pela música que cada semovente está ouvindo. Abestados, nesse caso a execução é privada, não pode, e que isso sirva de alerta aos manés que ligam os fones externos do telefone apenas porque estão querendo que o momento tenha uma trilha sonora. Se o Ecad te pega, prego, é capaz de levar o teu telefone.

Em 2012, o Ecad queria cobrar pela execução de músicas no Youtube, mas como nem tudo é fácil demais e a internet não é um território em que impera exclusivamente os desvarios brasileiros e, em face da repercussão negativa nos meios internacionais, a iniciativa (por enquanto) não vingou. Os caras foram mexer com o Google, vejam só.
Os Stones já viram de tudo nessa vida, mas como essa do Ecad...
Temos memória curta, mas essa vale a pena lembrar. Corria o ano de 2006 e na cidade do Rio de Janeiro, a expectativa era grande devido ao show gratuito dos Rolling Stones. O noticiário da época registrou a ação “preventiva” do Ecad, que ameaçou melar o show dos Stones, caso a banda não depositasse, antecipadamente, R$ 1 milhão, à guisa de direitos autorais. Vejam, a banda veio para um show gratuito (quem pagou por isso não vem ao caso agora) e iria tocar as próprias músicas, mas o Ecad entendeu que execução pública de músicas pressupõe que se deve pagar por ela. Disseram que o Ecad esperaria os Stones no aeroporto com o boleto de cobrança. Não tenho como afirmar aqui, mas acho que isso, felizmente, não aconteceu.

O mais incrível, em que pese uma paulada de ações judiciais que ao longo do tempo foram postuladas questionando a “legitimidade” do Ecad para fazer o que faz em nome de associados e não associados, os tribunais superiores brasileiros tem longo histórico de jurisprudências em favor do Ecad. Como e porque, é uma questão que só o saber jurídico e todo o seu obscurantismo (i)lógico podem explicar.
Em 2013 artistas tiveram movimentação intensa em torno de mudanças na cobrança de direitos autorais
Em agosto de 2013 um novo capítulo começou a ser escrito quando a presidente Dilma sancionou a “lei do Ecad”, na verdade a lei 12.853/13, que dispõe sobre a gestão coletiva de direitos autorais. Com esse novo diploma, o governo federal afirma entrar em cena na regulamentação e fiscalização do processo de arrecadação e distribuição dos direitos autorais. Notícias da época revelam a movimentação de artistas nos corredores do parlamento (leia-se lobby) em favor de mudanças no estado de coisas.

O Ecad? Bem, a nova lei não acabou com o Ecad, mas sublinhou que o Escritório Central de Arrecadação e Distribuição de Direitos Autorais continua responsável por recolher os “direitos” e será submetido a “normas mais rigorosas” de atuação e transparência, com taxa de administração fixada em incríveis 15% (antes tal taxa era de 25%). De cada R$ 10,00 arrecadados, R$ 1,50 vai para os cofres do Ecad.

Forçando a barra, quem é mesmo o Ecad? Ao que consta, o Escritório Central de Arrecadação e Distribuição de Direitos Autorais, segundo afirma em seu website, é composto por nove associações de música e “representa todos os titulares de obras musicais filiados a elas”.

As associações: Associação Brasileira de Música e Artes (ABRAMUS), Associação de Músicos, Arranjadores e Regentes (AMAR), Associação de Intérpretes e Músicos (ASSIM), Sociedade Brasileira de Autores, Compositores, e Escritores de Música (SBACEM), Sociedade Independente de Compositores e Autores Musicais (SICAM), Sociedade Brasileira de Administração e Proteção de Direitos Intelectuais (SOCINPRO), União Brasileira de Compositores (UBC), além da Associação Brasileira de Autores, Compositores, Intérpretes e Músicos (ABRAC) e da Sociedade Administradora de Direitos de Execução Musical do Brasil (SADEMBRA).

Conhece alguma delas? Nomes estranhos, hein. Sobre o Ecad, corre o seguinte comentário: a entidade seria controlada pelas empresas multinacionais do ramo do entretenimento. A IFPI-Latina (a seção latina da Federação Internacional de Produtores Fonográficos) seria um dos braços fortes. A IFPI diz representar a indústria fonográfica em todo o planeta (algo em torno de mais de 1400 empresas fonográficas em 75 países, como membros). Entre os membros da IFPI nomes como a Universal Music, dentre outros muito poderosos. Pensam que a indústria fonográfica acabou ou que dependia apenas da vendagem de unidades físicas, como cds e dvds, que estão em declínio faz uma data?

Estamos na superfície das investigações. No submundo corre a informação de que o Ecad e seu controle são ingredientes de outras brigas, como a das biografias, aquele rolo que envolveu biógrafos, Roberto Carlos e o pessoal do Procure Saber (Caetano, Gil, Chico etc). Na falta de um parlamento que realmente faça as leis, recentemente tivemos a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) e seu ativismo judiciário decretando o fim da autorização prévia ou vedação de publicação de biografias por parte de biografados que querem o controle absoluto sobre o que se diz a seu respeito (um outro assunto, outra longa conversa).
Ecad: onipresente país afora
Em seu website, o Ecad esclarece que tem estrutura e tanto: sede no Rio de Janeiro e “possui 34 unidades próprias instaladas nas principais capitais do Brasil, além de dezenas de agências autônomas credenciadas”. Segue na homepage da instituição uma janela de busca onde está escrito: “Encontre o representante do Ecad mais próximo de você”.

Vejam, esse espaço não pretende ser um tutorial de como acessar o Ecad na internet, longe disso, mas informamos aqui que na homepage do órgão é possível encontrar serviços e facilidades “online”, tais como a impressão de segunda via de boleto de “cobrança de retribuição autoral”; atualização cadastral, para que seja mais fácil o Ecad te encontrar; “envio de programação musical” e “simulação de cálculo”.

No ícone “envio de programação musical”, por exemplo, temos a divisão em “tv”, “cinema” e “shows/eventos”. Dependendo do caso, tem-se, a ser devidamente preenchido, a planilha de programação musical, o “processo necessário para o envio do borderô e roteiro de cinema”, e, para os que vão realizar shows/eventos um guia de como “enviar a programação musical correta”.

Na simulação de cálculo, como o nome diz, é uma simulação do cálculo da “retribuição autoral”. Esta deverá ser validada pela “unidade ou representante do Ecad mais próximo”.

Por que as coisas são assim? Boas perguntas. Uma coisa meio brasileira, digamos, talvez explique uma parte do todo.
Falecido em 2006, Mario Zan continua firme e forte no período de festas juninas
Fato é que, no período de festas juninas, aqueles que adoram os folguedos logo percebem quando a festa está boa. Tá tocando Gonzagão, Mário Zan, Anastácia, Dominguinhos? Certamente a paróquia/clube pagou por isso. Se os herdeiros do Gonzagão, do Mário Zan, da Anastácia e do Dominguinhos estão, de fato, recebendo por isso, bem, a conversa é outra.

Como complemento a esse escrito, segue a tabela divulgada pela assessoria de imprensa do Ecad acerca do ranking dos autores com maior rendimento nas festas juninas de 2014. A especificação pecuniária correspondente não foi divulgada. Segundo o release, “em 2014 mais de oito mil artistas receberam quase R$ 2 milhões pela execução pública de suas músicas no segmento de Festas Juninas”.

Ranking de autores mais tocados nas festas juninas (2014):

1 Gonzagão
2 Mário Zan
3 Tato
4 Zé Dantas
5 Sorocaba
6 João Silva
7 Dorgival Dantas
8 Lamartine Babo
9 Alberto Ribeiro
10 Palmeira
11 Dominguinhos
12 Humberto Teixeira
13 Alceu Valença
14 Petrúcio Amorim
15 Cecéu
16 Antônio Barros
17 Luiz Fidélis
18 Accioly Neto
19 Thomas Roth
 20 Zé Ramalho

Ranking de obras mais executadas nas festas juninas de 2014:

Ranking - Título da obra musical - Referência autoral

1 Festa na Roça (Palmeira/Mário Zan)
2 O Sanfoneiro Só Tocava Isso (Haroldo Lobo/Geraldo Medeiros)
3 Pagode Russo  (João Silva / Gonzagão)
4 Olha Pro Céu (Gonzagão/José Fernandes de Carvalho)
5 Quadrilha Brasileira (Gerson Filho/José Maria de Aguiar Filho)
6  Asa Branca (Humberto Teixeira/Gonzagão)
7  Lepo Lepo (Magno Santana/Filipe Escandurras)
8  São João Na Roça  (Zé Dantas/Gonzagão)
9  O Xote das Meninas  (Zé Dantas/Gonzagão)
10  Esperando na Janela (Raimundinho do Acordeon/Targino Gondim/Manuca Almeida)
11 Eu Só Quero um Xodó (Anastácia/Dominguinhos)
12 Marcando a Quadrilha (Mário Zan)
13 Antônio, Pedro & João (Benedito Lacerda/Oswaldo Santiago)
14 Pula a Fogueira (João Bastos Filho/Amor)
15 Sonho de Papel (Alberto Ribeiro)
16 Frevo Mulher (Zé Ramalho)
17 Chegou a Hora da Fogueira (Lamartine Babo)
18 Vai no Cavalim (Big Big/Samy Coelho)
19 Rindo à Toa (Tato)
20 Todo Mundo (tema da Coca-Cola FWC)

quarta-feira, 17 de junho de 2015

Roteiro 240 / Nelson Sargento

"Samba, agoniza mas não morre / Alguém sempre te socorre / Antes do suspiro derradeiro. / Samba, negro, forte, destemido / Foi duramente perseguido / Na esquina, no botequim, no terreiro".

Essa letra, misto de testemunho, denúncia, indignação, mas sobretudo, otimismo é parte da canção "Agoniza mas não morre", de Nelson Sargento, um sobrevivente da mais alta estirpe do samba do Rio de Janeiro.

Nelson Sargento, 90 anos, comemora o aniversário levando país afora a fina arte da síncope. Vai cantar em Brasília, de 25 a 28 de junho de 2015, no Teatro da Caixa. Junto aos amigos do Galo Preto e de Pedro Miranda, considerado uma das renovações do samba da Lapa, Sargento promete mais uma aula do mais brasileiro dos ritmos.

Acima de tudo um grande ouvinte, Sargento é dos poucos a falar em derivados do samba, como o pagode-de-mesa e o samba de terreiro. Com tanta experiência e anos de dedicação, Sargento virou um teórico como poucos. Além de defender belos sambas, numa genealogia que remete a si próprio, e a Cartola, Nelson Cavaquinho, Sinhô, João de Barro, Pixinguinha, dentre tantos legítimos heróis brasileiros, Nelson Sargento costuma falar coisas que nos soam estranhas, como as mudanças na estrutura do samba.

Só de perguntar "para onde vão os sambas enredos que não são aproveitados nos desfiles?", percebemos algo de grande na indagação. Considere o seguinte: no Rio de Janeiro temos atualmente 12 escolas de samba somente no grupo Especial (Viradouro, Mangueira, Mocidade, Vila Isabel, Salgueiro, Grande Rio, São Clemente, Portela, Beija-Flor, União da Ilha, Imperatriz e Unidos da Tijuca).

Nelson Sargento afirma que cada escola recebe, em média, 40 sambas-enredos, daí escolhe um. O que acontece com os que não são aproveitados? Mistério, daí não ser difícil afirmar que o samba agoniza, mas não morre.

Este que vos escreve é autor de umas poucas linhas sobre Nelson Sargento na revista Roteiro Brasília, cuja edição número 240 encontra-se disponível em versão impressa e no website da publicação.

terça-feira, 16 de junho de 2015

One of my heroes: Edgar Froese (Tangerine Dream) (1944-2015)


One of my heroes: Christopher Lee (1922-2015)


Piano in the park

Carreta/palco do Museu Itinerante do Piano, em Brasília

Um piano ressoando no ermo do Planalto Central. Parece aqueles vídeos espetaculares dos caras do Piano Guys, um piano em pleno cânion americano, mas não. É um piano no fim de tarde no Parque da Cidade de Brasília, mais precisamente a programação musical do Museu Itinerante do Piano. Estamos em junho e já é quase inverno seco nessas bandas do Brasil.

Vamos por partes. Uma carreta tipo baú, de 19 metros de comprimento, três eixos de rodas na carroceria. A carreta, na verdade, é o Museu Itinerante do Piano. Isso, um museu sobre rodas. Dentro, cerca de 15 exemplares de píanos, máquinas das mais diferentes formas, tamanhos e épocas, incluindo réplicas, como a de um Doublepiano, um piano dois em um, isto é, um piano com dois teclados dispostos em lados opostos, permitindo o uso por um, dois, três, quatro executantes (ou mais, sabe-se lá a partitura e a criatividade).

Réplica do Doublepiano e seu construtor, o técnico-afinador de pianos Rogério Resende
Um minuto para insistir no Doublepiano. Trata-se de réplica do Pleyel Doublepiano, fabricado por Gustave Lion, na França, cerca de 1890. Um piano construído a partir de uma imagem, uma fotografia da época. O autor da façanha, o técnico-afinador de pianos Rogério Resende. Passemos aqui um marca-texto no nome de Rogério Resende, o criador e curador do Museu Itinerante do Piano, pois, apesar não podermos dissociar uma coisa da outra, é preciso um capítulo inteiro só para dele.

Um piano para o pianista e seu melhor amigo
Continuando no Museu Itinerante do Piano, temos ainda outra simpática réplica, a de um piano vertical, o qual, na altura dos pedais, encontra-se uma portinhola, e dentro dela um cãozinho (de pelúcia, é claro). Entenderam? Um piano com uma casinha de cachorro. O projeto é suíço, de 1831, mais uma informação que denota o cuidado do Museu Itinerante do Piano e seu criador com esta fina arte, a de martelar cordas, em tons piano, evidente.

Rogério Resende e o piano da professora Neusa França
Mais adiante temos o Zeitter & Winkelmann, vertical, de 1925, fabricado pelo alemão Eduard Seiller. Aos moradores de Brasília, um aviso: trata-se de relíquia que prestou longos serviços à sua proprietária, a pianista e professora Neusa França, cujo nome encontra-se gravado na epopéia da cidade. Ficamos sabendo que ela doou o instrumento ao Museu Itinerante do Piano. Nas mãos de Rogério Resende virou uma jóia restaurada, verdadeira flor rara do Cerrado.

O Museu Itinerante do Piano guarda muitas outras surpresas ao visitante. Cada exemplar, finamente cuidado, revela o amor intenso por essa profissão, muito incomum em nossos dias, a de técnico-afinador de pianos. O que estamos vendo, os lindos pianos, nos causa impacto, pois a vontade inerente de quem observa um instrumento musical é vê-lo (ou senti-lo) tocando, isto é, produzindo música. Calado, o piano, magnífico, só está esperando que alguém que lhe revele a alma. Como toda máquina, precisa dos cuidados certos e de mãos habilidosas e sensíveis que lhe saibam extrair os mais belos sons.

Professor Joel Bello Soares, um gigante entre nós
Voltemos ao tal piano ressoando no ermo. Chega a noite e, no palco acoplado à carreta, o professor Joel Bello Soares surge feito gigante junto ao Yamaha meia cauda. Um breve aplauso do modesto público e em seguida a “Balada N° 1 em Sol Menor”, de Chopin, será o som onipresente. Aliás, uma mesa de som muito bem azeitada nos permite perceber graves e agudos e chegar à conclusão: esse piano tem dignidade.

O set do professor Joel Bello Soares, 80 anos, termina com a “Grande Fantasia Triunfal sobre o Hino Nacional Brasileiro”, de L.M. Gottschalk. Uma peça, por si só, de grande interesse, afinal, é o Hino Nacional Brasileiro e nesses dias em que esse escrito é forjado ainda se presta reverência a esse símbolo nacional. Aliás, pensando bem, interessante notar que o hino (música e letra) é um bem imaterial que os povos fazem questão de manter e bem cuidar.

Trio Alguidá: John Coltrane sem sax
Antes que a descrição vire ata protocolar, basta dizer que o Alguidá Trio (ou Trio Alguidá), a atração programada a seguir, na programação musical do Museu Itinerante do Piano (ao ar livre, no Parque da Cidade de Brasília), cometeu a ousadia de tocar “Naima”, de John Coltrane, sem o sax característico dessa peça jazzística. O trio instrumental formado por Tekokatu Enitan (piano/vocais), Ronaldo Gaffa (bateria) e Artur Souza (baixo elétrico) é prova de que o jazz e suas deambulações sonoras é música no contexto do improviso e da provocação do ouvinte. Por isso é jazz. Esses meninos são bons pra caramba.

Fechando a noite, quando Vênus e Júpiter brilham fulgurantes no céu sem nuvens de Brasília, um grupo, misto de saltimbancos, gurus de túnica indiana, e músicos clássicos toma lugar e, de repente, estamos diante de algo diferente nessas paragens.

Como Nasceram as Estrelas: Clarice Lispector com sotaque português
Abram alas que o Toy Ensemble, de Portugal, começa o espetáculo “Tocado, Falado & Riscado”. Este é o epíteto da estranha e agradável mistura de música, literatura e artes gráficas, com o característico sotaque português. O mais inusitado: trata-se da musicalização da obra “Como Nasceram as Estrelas”, de Clarice Lispector.

Aqui temos a mais brasileira das ucranianas investigando doze lendas do folclore nacional. Curumins transformados em estrelas, bichos em alvoroço, o Uirapuru (o pássaro da sorte), Pedro Malazarte, o Curupira, o Saci-Pererê, enfim, para cada mês Clarice dedicou uma estória. E não é que em Portugal isso virou música para ver e ouvir?

Toy Ensemble e o compositor Fernando Lapa (segundo à esquerda)

Sob a narração do ator António Durães, os músicos Jed Barahal (violoncelo), Christina Margotto (piano), Marco Pereira (flauta), Ricardo Alves (clarinete), David Lloyd (violino) e Paulo Costa (percussão), o Toy Ensemble, executam com maestria a música composta por Fernando Lapa. O som é camerístico, com espaços para os instrumentos ora aparecerem, ora soarem em uníssono.

No dia seguinte (foram dois dias de programação musical, acompanhando os dois dias de visitação pública no Museu Itinerante do Piano), um problema, se é que se pode chamar de problema. Tarde quente e o parque de súbito será tomado por programação musical, digamos, concorrente.

O Museu Itinerante do Piano e sua música para piano terá que antecipar tudo, pois conhecida cantora baiana (muito bonita, muito talentosa e muito simpática, por sinal) vai cantar de graça junto a um jovem talento do rap, um dueto que roda o país levando ao público a música de Tim Maia. Ficamos sabendo depois que o tal show, patrocinado por marca de cosméticos, levou 50 mil pessoas a uma das áreas do Parque da Cidade Brasília “Dona Sarah Kubitschek”.

O Museu Itinerante do Piano não tem a menor chance de atrair público. Rápido, Rogério Resende e equipe antecipam a programação, fazendo com que a música comece antes de a baiana rodar seu charme. Interessante notar que a belíssima programação musical escolhida por Rogério Resende súbito concorre com música, digamos, de maior apelo popular. Só lembrando que antes do tal tributo a Tim Maia, o reggae ecoa forte em área adjacente. O público, majoritariamente jovem, talvez não esteja interessado em solos de piano. Isso é música muito circunspecta, para ouvir sentado, afinal.

Assim, temos sob alta temperatura e secura proeminente o pianista local Pablo Marquine, que nos deixa flutuando ao som de sonatas compostas pelo amazonense/brasiliense Claudio Santoro (1919-1989). O maestro, que dá nome ao Teatro Nacional de Brasília, foi o fundador de sua orquestra. Suas obras para piano vêm sendo redescobertas, corrigidas e ainda estão por serem executadas em sua íntegra. Pablo Marquine, um estudioso da obra de Santoro, nos revela apenas um pouco do que está por vir.

Christina Margotto ao piano, Jed Barahal (atrás) no violoncelo
Ainda sob forte calor seco, dois músicos do português Toy Ensemble, a pianista brasileira, radicada em terras lusitanas, Christina Margotto, e o violoncelista norte-americano Jed Barahal nos brindam com uma hipnótica “Modinha”, de Francisco Mignone (1897-1986). Daí em diante, peças para piano e cello revelam que o rei dos instrumentos é soberano em duos.

Renato Vasconcellos, Leander Motta e Osvaldo Amorim: monstros
Para terminar, o trio de Renato Vasconcellos. Compositor, arranjador e pianista de notável senso jazzístico, Renato tem vasto currículo como acompanhante de artistas consagrados da Música Popular Brasileira. Aqui, acompanhado do percussionista Leander Motta e do baixista Osvaldo Amorim, temos o jazz instrumental domando a tarde. Aliás, os três são, com o perdão do clichê, monstros sagrados da música feita em Brasília. Os três músicos, donos de currículos invejáveis, mostram um entrosamento em que os sons de seus instrumentos dialogam e tecem trama musical cheia de “groove”. Um som irresistível. Os amantes da música aplaudem de pé. This is jazz, man. Bring your ears, come in peace and enjoy this.
Um piano ao cair da tarde