quarta-feira, 26 de agosto de 2015

Bob Dylan, o mais chato dos chatos (segundo Ruy Castro)

 
Para alguém acostumado a levar pedrada, deve ter machucado feito bolinha de papel na cabeça as queixas do escritor/jornalista mineiro/carioca Ruy Castro, que vociferou aborrecido contra (mais uma) lista publicada pela revista Rolling Stone, a dos “100 maiores compositores de todos os tempos”.

Tudo porque, encabeçando a lista, está um tal de Bob Dylan, que chegou à frente de Paul McCartney e John Lennon, respectivamente segundo e terceiro colocados na escolha. Tal fato (não exatamente a lista, mas os comentários de Ruy Castro) mereceu chamada de capa em um dos jornais mais influentes do país, a Folha de S.Paulo (edição de segunda-feira, 24/08/2015), além, é claro, do espaço que o escritor tradicionalmente ocupa, sempre na página 2, no rodízio de articulistas mantidos pelo periódico paulistano.

“Sua música é pobre, óbvia, sem interesse melódico ou harmônico. Serve só para carregar a letra, e olhe lá. Mas eu o poria em primeiro também – na lista dos 100 maiores chatos de todos os tempos”, esculhamba o renomado autor, entre outros, de “Chega de Saudade: a História e as histórias da Bossa Nova” e o “O Anjo Pornográfico: a Vida de Nelson Rodrigues”.

Ruy Castro de olho em você, Dylan
Segundo Ruy Castro, a lista da Rolling Stone é estapafúrdia, pois, além de Dylan na cabeça, só tem roqueiros ingleses e americanos, “incluindo um sujeito chamado Babyface, a dupla Timbaland e Missy Elliott e um tipo em andrajos, Kanye West”. Revolta mesmo porque nomes como Duke Ellington, Ary Barroso, e Ernesto Lecuona foram ignorados, idem gigantes do porte de Johann Strauss, Franz Lehar, Cole Porter e Noel Rosa.

Entra em cena o advogado do diabo. Primeiro, espernear sobre essas listas é pura perda de tempo. Depois, é óbvio que as listas são parciais (reflete a vontade de seus editores) e, principalmente: a Rolling Stone é publicação de origem americana, que desde o nascimento tem como matéria prima o rock, seus derivados e seu impacto na cultura anglo-saxônica. Portanto, caro Ruy Castro, é muito pouco provável que veremos Elomar, Gordurinha, Jackson do Pandeiro e Cartola brilhando em destaque nas páginas da Rolling Stone americana.

Um outro ponto de vista diz respeito às indisfarçáveis preferências musicais de Ruy Castro, conforme se depreende de seus escritos, em livros e crônicas. Se o leitor tiver alguma dúvida sobre a bossa nova, Carmen Miranda, o jazz e a música popular anglo-saxônica do século XX (sobretudo anos 1930, 1940 e 1950), basta correr as páginas de Ruy Castro, para elucidar mil e um fatos. Tudo temperado com uma escrita saborosa e elucidativa de alguém que conhece muito sobre esses fatos.


Em “Tempestade de Ritmos”, coletânea de artigos, Ruy Castro abre raro espaço para falar de rock. Quem o conhece sabe que guitarras rugindo e vocais berrados não são exatamente a sua praia. Mas no artigo “Macho mesmo era o velho rock and roll”, que o livro em questão assinala como originalmente publicado em 28/08/1999, Castro comenta sobre antigos “ritmos violentos dirigidos a jovens”, diversos do rock, tais como o charleston, o boogie-woogie, e o jitterbug.

Afirma o escritor: “Esse é um problema frequente em pessoas que ouvem rock demais: sabem pouco sobre o que aconteceu antes de sua geração, o que equivale a dizer que desconhecem a música do passado pré-rock”.


Daí, segue comentário sobre uma coletânea lançada pelo selo Rhino (especializado em reedições), chamada “Loud, fast and out of control”, “com 104 faixas de grande rock and roll gravadas entre 1953 e 1959”. Segundo o jornalista/escritor, as faixas da coletânea (que inclui números dos grandes Bill Haley e seus Cometas, Elvis Presley, Eddie Cochran, Chuck Berry, Gene Vincent, entre outros) demonstram “a riqueza e a variedade do rock and roll, qualidades que ele foi perdendo à medida que se tornou apenas rock e deixou de rolar”.

Sobre as pedradas em Dylan, Robert Zimmermann sabe de longa data de onde elas vêm. No ótimo documentário “Don’t Look Back”, de Don Alan "D. A." Pennebaker, lançado em 1967, temos várias delas: vemos um artista tentando se desvencilhar da histérica pecha de “gênio”. Um sujeito implora para que Dylan mostre as mãos, enquanto alguém da plateia o chama de “traidor” por ter abandonado a pureza folk em favor do rock turbinado por guitarras elétricas. Faz mais ou menos 50 anos que essa história se repete.

Bob Dylan em Brasília, segundo foto do jornal Correio Braziliense
Quem conhece Dylan sabe que suas belas canções jamais foram tocadas e cantadas pelo próprio do mesmo jeito. Sim, Dylan é um chato, mas um chato tolerável, desde que mantido à distância. Quando esteve em Brasília, em 17 de abril de 2012, óbvio, não deu entrevistas, não procurou ser simpático (mas também não foi mal-educado), e sua apresentação foi feita com os telões apagados.

Bob Dylan & Banda em Brasília, 17/04/2012
Quem estava lá atrás, no Ginásio Nilson Nelson, ouviu mas viu uma figura diminuta no palco. Para este escriba e maioria dos presentes, foi uma grande aula de rock and roll. Ruy Castro precisava estar lá.

Ah, sim, a lista da Rolling Stone:

100. Björn Ulvaeus and Benny Andersson
99. Tom T. Hall
98. Otis Blackwell
97. Taylor Swift
96. Timbaland and Missy Elliott
95. The Bee Gees
94. John Prine
93. Billie Joe Armstrong
92. Paul Westerberg
91. Eminem
90. Babyface
89. Felice and Boudleaux Bryant
88. Barry Mann and Cynthia Weill
87. Kris Kristofferson
86. Sam Cooke
85. R.E.M.
84. Kanye West
83. Nicholas Ashford and Valerie Simpson
82. Marvin Gaye
81. Björk
80. R. Kelly
79. Lucinda Williams
78. Curtis Mayfield
77. Allen Toussaint
76. Loretta Lynn
75. Isaac Hayes and David Porter
74. Patti Smith
73. Radiohead
72. Fats Domino and Dave Barthomolew
71. Walter Becker and Donald Fagen
70. Dan Penn
69. James Taylor
68. Jay Z
67. Morrissey and Marr
66. Kenny Gamble and Leon A. Huff
65. George Harrison
64. Bert Berns
63. Chrissie Hynde
62. Harry Nilsson
61. Doc Pomus and Mort Shuman
60. Willie Nelson
59. Tom Petty
58. George Clinton
57. Joe Strummer and Mick Jones
56. Madonna
55. Tom Waits
54. Kurt Cobain
53. Stevie Nicks
52. Notorious B.I.G.
51. Willie Dixon
50. Billy Joel
49. Don Henley and Glenn Frey
48. Elton John and Bernie Taupin
47. Neil Diamond
46. Norman Whitfield and Barrett Strong
45. Robbie Robertson
44. Jimmy Webb
43. Johnny Cash
42. Sly Stone
41. Max Martin
40. John Fogerty
39. David Bowie
38. Al Green
37. Jackson Browne
36. Jerry Garcia and Robert Hunter
35. Bono and the Edge
34. Michael Jackson
33. Merle Haggard
32. Burt Bacharach and Hal David
31. Dolly Parton
30. Pete Townshend
29. Buddy Holly
28. Woody Guthrie
27. Ray Davies
26. James Brown
25. Randy Newman
24. Elvis Costello
21. Robert Johnson
20. Van Morrison
21. Lou Reed
20. Jerry Leiber and Mike Stoller
19. Ellie Greenwich and Jeff Barry
18. Prince
17. Neil Young
16. Leonard Cohen
15. Eddie Holland, Lamont Dozier and Brian Holland
14. Bruce Springsteen
13. Hank Williams
12. Brian Wilson
11. Bob Marley
10. Stevie Wonder
9. Joni Mitchell
8. Paul Simon
7. Carole King/Carole King and Gerry Goffin
6. Mick Jagger and Keith Richards
5. Smokey Robinson
4. Chuck Berry
3. John Lennon
2. Paul McCartney
1. Bob Dylan

Nenhum comentário:

Postar um comentário